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História de Penápolis

É preciso acautelar um patrimônio

É PRECISO ACAUTELAR UM PATRIMÔNIO

“Pensar que o homem nasceu sem uma história dentro de si próprio é uma doença. É absolutamente anormal, porque o homem não nasceu da noite para o dia. Nasceu num contexto histórico específico, com qualidades históricas específicas e, portanto, só é completo se tem relações com essas coisas. Se um indivíduo cresce sem relações com o passado, é como se tivesse nascido sem olhos nem ouvidos e tentasse perceber o mundo exterior com exatidão. É o mesmo que mutilá-lo”
. Carl Jung cit Renato Carrazedo

“Patrimônio não são apenas as coisas que podemos tocar mas principalmente as coisas que nos tocam”.

No elenco da bibliografia brasileira que se ocupa da fundação das cidades, ainda são raros os estudos pertinentes à formação dos primeiros aglomerados rurais, seu contexto psicológico e a organização formal de um domínio construído, cujos conhecimentos interessam sobretudo para um planejamento de ação contemporânea, e a preservação dos fatores históricos e formas sócio-culturais regionais.

Picadas rústicas, abertas pelo bandeirismo, facilitaram o fluxo migratório de algumas famílias mineiras que, devido à decadência de sua província de origem, vieram estabelecer-se nos “Terrenos Desconhecidos” da região do Avanhandava, no ano de 1842, com a finalidade de lutarem por sua sobrevivência . Ali, às margens do ribeirão Lajeado, fundaram o Patrimônio de Nosso Senhor dos Passos , ponto de partida para o desbravamento e colonização deste sertão.

Esses contingentes, que formaram pequenos bolsões de um povoamento escasso vivendo de forma gregária, construíram suas casas de pau-a-pique ao redor de um Cruzeiro(primeiras edificações erguidas). Mais tarde surgiram as capelas com os Santos de suas devoções, dada as suas tradições religiosas. Em seguida construíram o monjolo, (para pilar os cereais, movido pelas águas do rio Lageado, em cujas margens se fixaram) e aos poucos, outras construções como a casa da farinha(onde se fabricava o polvilho, a farinha de mandioca e o fubá extraído de suas roças de milho, além do pequeno e rudimentar engenho -movido por junta de bois- que fabricava o açúcar mascavo, produto da cana de açúcar que também plantavam em suas lavouras de subsistência, produzindo assim tudo o que necessitavam para o seu consumo, sem a preocupação de gerar excedentes para o mercado capitalista que, anos mais tarde, depois de implantado na região, gerou tanta competição e acabou por sucumbí-los. O que se produzia com certa fartura era trocado por sal e outros gêneros de primeira necessidade em cidades banhadas pelo rio Tietê, que facilitava a navegação dos batelões(canoas atreladas). Assim, assentados nessa economia natural, respeitavam as florestas, território dos índios, e não competiam com eles, apesar destas inóspitas terras serem consideradas devolutas pelos governos da época. Se tentavam, sem traumas, invadir seu território, eram logo lembrados, com montinhos de terra atravessados por flechas que, aqueles domínios pertenciam a esses primitivos donos. A convivência foi amistosa por quarenta e quatro anos. E também a harmonia entre homem e meio ambiente.

Mais tarde, mesmo que cada família tenha se apossado de uma gleba de terras, essas terras continuaram reúnas, sem divisões, sem cercas, e o sistema vigente era o de mutirão de ajuda mútua, nas épocas de colheita e outros serviços. Não havia escravos

O Patrimônio dos Passos, situado no centro dessas fazendas, continuou a ser o local de encontro da comunidade por ocasião das festas religiosas, das missas, procissões, bailes, festas juninas e, mais tarde, local de alfabetização dos filhos naturais ou adotivos (muitos em cada família) dos fazendeiros e também de seus agregados. Destas pessoas semi-alfabetizadas algumas se destacaram no campo da literatura como Carmita Ahmad, Aparecida Monteiro e outras pessoas sensíveis que cultivavam os mais nobres sentimentos de solidariedade e amor ao próximo, e outros exemplos de valores éticos e morais, de um povo altruísta, espiritualista, corajoso e forte.“

Através da história, em vários lugares e em várias épocas, homens e mulheres gigantes na alma e na humildade, nos deixaram exemplos de vida e nos indicaram caminhos, alguns ícones e códigos, para uma vivência harmônica entre o “Eu” individual e o meio em que se vive, quer seja natural, quer seja social e cultural ou econômico.

“A partir de 1870/80 porém, com o advento do café e outros mecanismos capitalistas -como a estrada de ferro, por exemplo, invadindo a região, esses valores passaram por profundas transformações e foram sendo substituídos e subjugados. Inserida no contexto da macro região brasileira que pretendia atender a demanda do café na Europa e Estados Unidos, a Noroeste Paulista com suas terras férteis, atraiu ambiciosos pioneiros que a adentraram afoita e traumáticamente com a finalidade de implantar as suas fazendas cafeeiras. Nesse momento, iniciou-se a derrubada das matas e a destruição da natureza e de sua biodiversidade, incluindo a dizimação dos índios que tentaram impedir com revides ora à espoliação de suas terras, ora à exploração de sua mão de obra e à destruição de sua organização social. Também o primitivo sertanejo, ou seja, os desbravadores, que viviam alheios à esse encadeamento estrutural foram desalojados e banidos da paisagem noroestina, pela revolucionária mudança econômica, que comprometeu seus valores e o seu relacionamento pacífico com os índios que, no ano de 1886, com os ânimos exaltados, se confrontaram também com seus vizinhos desbravadores com quem conviviam amistosamente. Os sobreviventes da chacina, antes de abandonarem a região, recolheram os corpos mutilados e os enterraram em vala comum, no cemitério de N. Sr dos Passos, única edificação que hoje testemunha esse difícil período da história do Desbravamento e primeira tentativa de Colonização da região Noroeste de São Paulo. Dezoito anos mais tarde, voltaram para o Patrimônio dos Passos e atraíram muitos outros habitantes para a região. No ano de 1910, por exemplo, mesmo que oficialmente já tivesse sido fundada Penápolis -a primeira cidade da região- (pelo político Bento da Cruz, ex-morador do Patrimônio, que desviou o traçado original da Estrada de Ferro -ao redor da qual surgiam as cidades- que cruzava o Patrimônio). Penápolis contava com 50 habitantes, enquanto no Nosso Senhor dos Passos residiam aproximadamente 2500 pessoas que, junto com os cafeicultores, fundaram as outras importantes cidades da região.

É Preciso Acautelar um Patrimônio para as gerações novas enlevadas na história, folclore e cultura de nossa Terra.

Historiadora: Glaucia M. de Castilho Muçouçah Brandão

Localização do Patrimônio Histórico: Rodovia Assis Chateaubriand (entre Penápolis e o Salto do Avanhandava no Rio Tietê
Distância de Penápolis: 11 K
Distância do Salto do Avanhandava: 10 K
Única edificação restante: Cemitério dos Desbravadores(ano de 1886)

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